Simon Vs. A Agenda Homo Sapiens, de Becky Albertalli|Resenha
“Simon Vs. A Agenda Homo Sapiens”: o amor representado na forma de livro
Um amor jovem. Verdadeiro, puro, natural. Ou, pelo menos, deveria ser, caso a opção sexual dos dois meninos não fosse justamente a causa dessa relação estar ameaçada. Por puro preconceito. Pela falta de naturalidade com a qual boa parte das pessoas lida com um relacionamento entre pessoas do mesmo sexo, fazendo-as se sentir deslocadas, reprimidas, julgadas. Simplesmente por amar. Felizmente, naturalidade é o que não falta em Simon Vs. A Agenda Homo Sapiens, livro de estreia de Becky Albertalli, publicado pela editora Intrínseca. Tanto que só uma palavra pode descrevê-lo: amor. Gente, mas é MUITO amor mesmo por essa obra!
Explico: Simon é um menino de 16 anos que é gay, mas ainda não tem coragem de contar para sua família e seus amigos. A única pessoa que sabe de seus sentimentos mais profundos e do seu “segredo” é Blue, um garoto misterioso com o qual ele troca e-mails e por quem está se apaixonando perdidamente. E tudo ia bem para Simon, até porque cabia a ele mesmo escolher a hora de sair do armário, até Martim, outro garoto da sua escola, descobre essa troca de e-mails e passa a chantageá-lo. A partir daí, a vida de Simon vira de cabeça para baixo, pois, além do medo de sair da sua zona de conforto e encarar uma situação para a qual ainda não se sente preparado, sua relação com o Blue pode acabar, antes mesmo de ter começado!
Antes de qualquer coisa, preciso dizer que o fato de a autora ser psicóloga e lidar diretamente com adolescentes ajudou e muito em seu livro. Principalmente na construção dos personagens, em sua ambientação e rotina. É impressionante a veracidade e a leveza que Becky dá à narrativa e aborda não apenas a questão da sexualidade, mas a adolescência, de um modo geal. A sua escrita é tão pura, tão verdadeira mesmo que é impossível não se conectar, logo nas primeiras páginas, à história. E principalmente a Simon. Que garoto incrível e fofo. MUITO fofo. Quero ser amiga dele. Simon não é apenas mais um adolescente com aqueles problemas e as inseguranças típicas da idade. É claro que isso também, afinal, ele tem 16 anos. Mas ele é mais do que isso. Ele tem uma personalidade cativante, um jeito de encarar a própria vida contagiante. E um humor bastante inteligente. Mas nada que o torne um clichê ou arrogante. Pelo contrário. Simon é sensível, amigo (e viciado em Oreo).
E, por falar em amigo, os outros personagens da trama são igualmente encantadores. Becky soube equilibrar as nuances dos jovens e caracterizar cada um deles de maneira bem específica, dando a todos as suas peculiaridades e essências, facilitando uma identificação instantânea por parte dos leitores. Que atire a primeira pedra quem não se viu, em algum momento, na pele de Abby, Nick, Nora, Leah, Alice e até mesmo de Martin. Sim, Martin. Pois é com ele que a autora aborda a questão principal de sua obra, um tema ainda hoje considerado um “tabu”. É Martin quem se apodera da possibilidade de escolha de Simon de se assumir. Quem representa todos os nossos preconceitos e julgamentos mais inconscientes e vergonhosos. Ainda que por pura falta de amadurecimento, Martin expõe Simon da pior maneira possível e o coloca em uma situação totalmente constrangedora, simplesmente porque o amor ainda não é visto como algo único, de todas as formas e cores. E que deveria ser um direito de todos. Mas é com Martin também que a escritora nos dá, talvez, uma das maiores lições, e o desenvolvimento desse personagem é das coisas mais emocionantes que já li.
A narrativa alternada entre o ponto de vista do protagonista e as trocas de e-mail entre ele e Blue só faz com que nos apaixonemos cada vez mais pelos dois. (gente, é sério. Blue também ocupa um lugarzinho especial no coração apenas por suas palavras. É impressionante). Que a gente torça a cada troca de páginas por eles e também sofra com Simon. Porque, olha, eu sofri. Me senti tão angustiada por ele que tinha até vontade de passar mais rápido a página para chegar logo em algum momento em que ele pudesse ter um pouco de paz e que as coisas voltassem a ser normais, como deveriam. É esse o tipo de envolvimento que Becky nos proporciona com sua escrita. A melhor coisa de Simon Vs. A Agenda Homo Sapiens é justamente o fato de ela não criar estereótipos. Simplesmente porque eles não existem. Simon e Blue são jovens como qualquer um e têm o direito de amar quem eles quiserem. Simples assim. E a construção desse romance é tão sutil, tão delicadamente trabalhada que nos leva a refletir constantemente. É uma trama ágil e, ao mesmo tempo, acolhedora. E surpreendente.
Tudo em Simon Vs. A Agenda Homo Sapiens inspira amor. Desde a relação do protagonista com a sua família (aliás, é com os pais de Simon que temos algumas das melhores tiradas do livro), até o seu dia a dia com os amigos. Inclusive, os momentos de incertezas, receios, alguns desentendimentos e as tristezas… Porque tudo isso faz parte da vida de todos nós. Afinal, somos, sim, iguais. E Simon, “no alto de seus 16 anos”, resume isso de uma maneira tão sagaz e tão óbvia, que não dá para entender o porquê de esse não ser o pensamento comum: se um hétero não precisa “se assumir” para ninguém e nem fazer disso um grande acontecimento, porque é assim para um homossexual? As pessoas simplesmente não podem escolher quem amam e ser felizes?
Que bom que Becky deu vida a Simon, a Blue e a todos os outros. Que bom que leitores poderão se sentir representados. Porque, independentemente da orientação sexual, eu me senti representada pelo amor.
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