Sway, de Kat Spears | Resenha
‘Sway’: uma outra cara para as tramas adolescentes
O capitão do time de futebol americano se apaixona por uma bela jovem que mal era notada nos corredores da escola. Ele é aquele popular que faz o tipo valentão. Ela é a jovem que adora ajudar o próximo. Dois mundo opostos. Um romance que precisa ultrapassar barreiras. Será que o amor é capaz de mudar as pessoas? Bem, se a transformação é possível, não é a questão de Sway, escrito por Kat Spears, lançado pelo selo Globo Alt. O foco aqui é bem mais interessante! Inusitado! Vamos conhecer a história de Jesse Alderman, o cara que transformou esse atleta boçal num homem a ser admirado. O cara que está sempre por trás dos acontecimentos estudantis. O cara que consegue tudo!
Jesse Alderman tem um talento para arrumar qualquer coisa para qualquer pessoa. Seja lícita ou ilícita. Providencia de trabalhos escolares à expulsão de alunos indesejáveis, além de arrumar cerveja para as festas e outras “coisinhas” a mais. Por isso, é conhecido como Sway, o cara que consegue tudo. Sabendo a fama de Jesse, o capitão do time de futebol da escola, Ken Foster, solicita um encontro com Bridget Smalley. Um trabalho simples, se a garota verdadeiramente boa não despertasse um sentimento no nosso anti-herói. Neste conflito ele fica no dilema entre cumprir a tarefa ou se deixar levar pela emoção.
Sway retrata o universo adolescente norte-americano, que tanto é glamourizado e encanta (influencia) os jovens em geral, porém, o livro tem uma perspectiva dos bastidores. Uma desconstrução deste conto de fadas. Torna os personagens mais reais, algo em voga no momento e que faz muito sucesso. No entanto, além de colocar o dedo na ferida dos jovens, o grande diferencial da obra em relação às demais é o protagonista, o papel que ele representa neste contexto.
O nosso anti-herói, Jesse Alderman, é aquele negociador que articula para que tudo funcione dentro do ambiente escolar. Aquele sujeito (meio sinistro) que passa batido nas tramas, com uma fala ou outra, e que some. Mas, em Sway, a sua história tem destaque. Seus anseios, como ele consegue as coisas, as moedas de trocas e os segredos. Uma característica que dá para adiantar é que ele é meio alheio a sentimentos. Tudo é uma grande negociação. Não tem amizades, digamos assim, convencionais. Isso reflete no seu comportamento. No começo da narrativa, Jesse é um pouco intragável e, como o livro é narrado em primeira pessoa, dificulta o engajamento. Mas a sucessão de acontecimentos, a escrita cativante de Spears e os bons personagens de apoio mudam rapidamente esta primeira impressão e mantêm o leitor vidrado nas páginas. E, quando se menos imagina, Jesse cativa e se mostra um protagonista fascinante.
Sway também contempla outros personagens igualmente interessantes. E, por mais que a história seja muito focada em Jesse, eles também tem seus momentos de destaque, ainda que, às vezes, apenas passem em seu caminho. Como sr. Dunkelman, Joey, Pete, Heather Black. No livro, suas tramas podem até não ser tão aprofundadas, mas são construídas na medida exata para dar liga a esse emaranhado de negociações, além de contribuir para o fio condutor principal.
Um detalhe que me chamou atenção no livro, mesmo não estando tão explícito, é como os acordos e conchavos estão muitos presentes na sociedade, inclusive naquele microambiente (o âmbito escolar). Todo mundo tem o rabo preso. Um deve favor para o outro. Tanto que, se ocorre um desgaste em uma das relações, gera um efeito dominó. Mesmo não tendo nada a ver, foi inevitável não pensar nos problemas da política brasileira… Mas vamos focar na relação entre os adolescentes.
Um dos principais pontos abordados em Sway é a aceitação das diferenças entre os jovens. A autora trabalha muito bem o porquê de algumas pessoas chamarem mais a atenção e serem populares, enquanto outras são marginalizadas, excluídas. Tudo isso com uma linguagem franca e sem aquele didatismo, a “lição de moral”. Os diálogos são afiados, autênticos e, em certos momentos, ácidos, representando o adolescente repleto de conflitos internos e virtudes.
Outro ponto bem legal de Sway é que a autora coloca algumas músicas no decorrer da narrativa. Ou quando os personagens lembram de uma música ou quando, no decorrer da cena, ligam o som e o aparelho toca uma determinada faixa. Este artifício não é nenhuma novidade em livros para o público jovem, porém, nunca tinha vivenciado essa sensação de ler escutando uma trilha sonora – isso porque tenho um pouco de dificuldade de concentração. Mas, como estava muito imerso na leitura, me deixei fazer essa experimentação. E preciso confessar que foi bem interessante. Misturar som e texto é uma combinação que pode oferecer uma nova forma sensorial do ato de ler. Por que não aproveitar as novas possibilidades? Destaque para cena em que é mencionado “In the Aeroplane Over The Sea”, do Neutral Milk Hotel. Um casamento perfeito!
Falando em uniões, o livro todo tem uma sinergia absurda. Tudo parece se encaixar perfeitamente. História, diálogos, temas abordados, personagens… Kat Spears soube tecer diferentes acordos e tramas em volta de um personagem, que, até então, sempre foi um mero coadjuvante, e construir em Sway algo inusitado e cativante. Tem elementos “clichês” do universo adolescente? Sim! Mas a grande sacada (mérito) é justamente transformar esses componentes comuns em algo original e fascinante. E isso pode ser feito com uma simples mudança de perspectiva, de narrador.
Livraria Cultura – Livraria da Folha – Livraria da Travessa – Saraiva – Submarino