Entrevista: Vitor Cafaggi, um dos autores de ‘Turma da Mônica – Laços’
Em entrevista ao Vai Lendo, Vitor Cafaggi falou sobre o seu trabalho, a emoção de ter criado, junto com a irmã, Lu Cafaggi, a história da Turma da Mônica que será adaptada aos cinemas e o reconhecimento internacional
O sonho de milhares de crianças e adultos, de leitores alfabetizados e formados ao longo de gerações, está prestes a se realizar. Finalmente, e pela primeira vez, veremos Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão “em carne e osso” nas telas dos cinemas. O longa metragem Turma da Mônica – Laços, com direção de Daniel Rezende, tem estreia prevista para 2019 e traz a história da graphic novel homônima criada pelos irmãos Vitor e Lu Cafaggi e publicada em 2013. Na trama, os quadrinistas emocionam o público ao remeterem às questões de amizade e dos laços que criamos ao longo da vida, incluindo aqueles desenvolvidos com as revistinhas e os célebres personagens, durante a infância.
“Recebemos esse convite (para desenvolverem a graphic novel Laços) no começo de 2011 e, logo na mesma noite, já começamos a pensar na história” contou Vitor em entrevista exclusiva ao Vai Lendo. “O convite foi emocionante, uma honra e uma alegria enormes pra gente. Em poucos dias, já tínhamos a sinopse e alguns estudos de personagens. Produzir a revista e criar a história foi um processo bem natural. Desde o início, queríamos uma história que conversasse com a infância das pessoas. Estando elas na infância agora, ou tendo passado por ela há dez, vinte ou trinta anos. A Turma da Mônica faz, ou fez, parte da infância de muita gente. Lu e eu procuramos resgatar esse sentimento”.
E esse resgate ao qual Vitor se refere, de fato, surtiu efeito, resultando não apenas numa continuação, Turma da Mônica – Lições (2015), mas também e principalmente no primeiro live action da turminha. Diante de tamanha responsabilidade, Vitor, assim como todos os fãs da Turma da Mônica, além da expectativa, não pôde deixar de sentir a insegurança, o receio em como a história chegaria ao público. Mas, agora, após viver esse processo da adaptação mais de perto, ele garantiu que não temos com o que nos preocupar. A Turma da Mônica, ele atestou, está em boas mãos.
“Quando fizemos a história de Laços, uma das coisas que pensamos foi exatamente como poderia ser um filme da Turma da Mônica”, explicou. “Mas nunca imaginávamos que, naquele momento, estávamos mesmo criando a história do que seria o primeiro filme da Turma. Quando falaram que iriam fazer um filme da nossa história, eu tinha um pouco de receio do que esse filme podia virar. Tinha medo de ser uma produção feita meio às pressas, sem recursos, ou que a história pudesse ser um pouco banalizada. Tinha medo de os atores serem crianças meio ‘forçadinhas’ também. Quando o Daniel Rezende pediu para ser o diretor do filme porque ele adorava a história de Laços, eu fiquei bem mais aliviado. O cara foi indicado ao Oscar pelo trabalho dele em Cidade de Deus. Não ia aceitar fazer qualquer filme. Quando eu vi as quatro crianças que tinham sido escolhidas para serem os protagonistas, fiquei mais tranquilo ainda. Agora que eu pude viver um pouco das gravações e conhecer melhor essas crianças, eu só sinto felicidade. Me sinto muito privilegiado por estar passando por isso”.
Laços também apresenta uma Turma da Mônica com traços diferentes daqueles aos quais estamos acostumados, com as personagens mais infantis. Vitor e Lu deram a sua impressão mais lúdica, quase cinematográfica mesmo, e nos emocionaram com uma história sensível e delicada. Afinal, quem melhor do que dois irmãos para retratar os nossos laços afetivos? E os Cafaggi têm propriedade de sobra para falar sobre isso.
“A ideia do projeto era essa, que pudéssemos mostrar a nossa versão dos personagens do Mauricio”, afirmou. “Então, não tivemos receio de mostrar isso. Meu traço e o do Lu são diferentes dos traços dos estúdios do Mauricio, mas ainda mantêm uma simplicidade e uma leveza que combinam com o tipo de história que está sendo contada e com esses personagens. E trabalhar com a Lu foi ótimo. A gente aprende muito um com o outro, a gente conversa muito, não só sobre quadrinhos. A gente pensa parecido. Minha irmã é uma das pessoas mais inteligentes e talentosas que eu conheço, então, é sempre bom ouvir o que ela tem a dizer. Na verdade, confio mais na opinião e no bom gosto dela do que nos meus. Ter mais alguém na minha casa fazendo quadrinhos torna isso um trabalho menos solitário. Enriquece muito o produto final”.
Embora recriar a Turma da Mônica não seja das tarefas mais simples, pelo contrário, o desafio não é inédito para Vitor, que, inclusive, ficou conhecido pelo público após criar a webcomic Puny Parker, na qual fazia uma releitura de um conhecido super-herói: o Homem-Aranha. E foi essa experiência que não apenas o levou ao Bairro do Limoeiro, mas o ajudou ainda a repensar Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão. Ele, que é professor da Casa dos Quadrinhos e reconhecido com o Troféu HQ Mix (em 2012 e 2013), agora, se prepara também para viver outro tipo de emoção: ter a sua obra publicada em outro país, com duas coletâneas das tiras Valente, personagem de sua autoria, com lançamento previsto nos Estados Unidos para o ano que vem (sob o título de Vincent).
“Foi essa HQ Puny Parker, a fanfic do Homem-Aranha, que abriu as portas para que eu fosse chamado para fazer o MSP50 e as tirinhas do Valente, no Globo”, disse. “E acho que essa experiência me ajudou, sim, na hora de criar as HQs da Turma. Desde o início eu sabia que tinha que respeitar o personagem e suas características, mas, ao mesmo tempo, poderia colocar um pouco de mim neles. Ter o Valente sendo publicado lá fora dá uma sensação legal de reconhecimento. Para mim, não é tão diferente trabalhar com personagens que eu criei e trabalhar com personagens de outros autores, já que consigo enxergar um pouco de mim ou de pessoas que conheço em cada personagem. O segredo é ver o personagem como uma pessoa, e não só como personagem”.
Como muitos artistas, Vitor também começou de maneira independente, utilizando a internet para se apresentar e mostrar o seu trabalho. E, tendo já passado por toda essa etapa inicial na rede mundial de computadores, ele ressaltou que é uma oportunidade única para novos profissionais e deve ser amplamente aproveitada.
“Além dos eventos, a internet é uma ótima vitrine”, concluiu. “Ela é um cartão de visitas para que o quadrinista mostre a qualidade do seu trabalho, seu profissionalismo e comprometimento”.
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