Resenhas

Literalmente, Lucy Keating | Resenha

‘Literalmente’: e se a nossa vida realmente desse um livro?

Em Literalmente, publicado pela Globo Alt, tudo parece normal na vida de Annabelle Burns. Sua vida segue uma rotina bem marcada, sua família é presente e cheia de amor, seus amigos são parceiros… Até o cachorro insuportável do seu pai oferece uma dose de adrenalina diária para a adolescente de 17 anos de Venice. As coisas começam a mudar, no entanto, quando em sua aula de escrita criativa conhece Lucy Keating. A escritora anuncia em alto e bom tom que está trabalhando em uma história que, bom, é, na verdade, a vida toda de Annabelle.

Apesar de uma hora para outra seus pais anunciarem a separação e a venda da sua casa de infância, Annabelle permanecia cética. Mas as mudanças começaram a ficar bastante peculiares e abruptas, deixando a garota desnorteada, seja com ruas incompletas ou com a chegada do menino perfeito – perfeito até demais – no meio do último ano do ensino médio e convenientemente mostrar certo interesse por ela.

Poucas coisas permanecem as mesmas, como seu irmão, o amigo dele, Elliot, e sua banda, porque até o odioso Napoleão – lembra do cachorro? – resolve se tornar seu melhor amigo. Em meio a muitas reviravoltas, Annabelle decide que sua vida precisa voltar para o eixo, para o seu eixo, tendo ela como sua própria guia. Afinal, ela não quer ser um personagem na história escrita por outra pessoa: ela quer fazer sua própria história.

Histórias onde o criador encontra a sua criação, apesar de não serem comuns, não são exatamente inéditas. Uma das mais marcantes que me vem em mente é a quebra da quarta tela em A Rosa Púrpura do Cairo, quando a personagem de Mia Farrow se apaixona pelo protagonista de um filme de ação nos anos 30 e revê o filme várias vezes, até que ele interrompe a história e começa a conversar com ela. O efeito engraçado e surpresa do filme de Woody Allen alimenta nosso interesse quase da mesma forma que no livro de Keating. Quem não gostaria de saber o que seus personagens acham de você? Ou então, quem não teve uma crush por alguma pessoa fictícia? Aquela velha história do Deus me livre, mas quem dera.

Annabelle não é uma protagonista muito desenvolvida, mas a narrativa completa, irônica e divertida compensa no livro de Keating. Às vezes, essa pode até ter sido a intenção da autora, não é? Literalmente é um livro curto, de escrita suave, daquelas que você lê “em uma sentada”. É um bom tipo de literatura para quem gosta de um bom young adult e precisa sair de uma ressaca literária.

O leitor entra na missão de Annabelle de forma bem fácil e torce para que a protagonista e todos os demais encontrem sua própria maneira de escrever suas vidas. Keating até fez um trabalho legal, mas… Go Annabelle, GO! Assim, nós, leitores, ganhamos risadas, apressamos as páginas e devoramos uma leitura leve para uma tarde de domingo.

Tenho, contudo, algumas ressalvas. Na edição brasileira, a tradução deixou um pouco a desejar. Me vi estranhando expressões que podiam ter sido substituídas por similares mais cotidianos com muita facilidade. Outra é o fato de os personagens não serem bem desenvolvidos. Em O Garoto dos Meus Sonhos, outra obra da autora, o casal protagonista é tão mais interessante – porque sabemos mais sobre eles – que ainda permanece o melhor livro de Keating para mim. Ainda assim, não deixo de recomendar Literalmente, caso você queira uma leitura descompromissada e consiga relevar esses pontos. Não deixei de me divertir e acho que você também irá.

Apaixonada por música, cinema, séries e literatura, história mundial e andar de bicicleta. Sonha em ter muitos carimbos em seu passaporte, mas por enquanto escreve sobre o que leu, viu e gostou no Anatomia Pop.

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