Especial Dia das Crianças: Coraline e minha iniciação no terror
Todo mundo, quando é criança, tem os seus “primeiros momentos”. E eu, como qualquer criancinha perfeitamente normal, tive um dos meus primeiros momentos com o livro Coraline, do Neil Gaiman — é claro que tinha que ser o Gaiman, que me acompanha desde menininha. Foi o meu primeiro momento com uma história de terror. Eu devia ter uns dez ou onze anos.
Muito fofo, né, gente?
Bom, na verdade, tenho que admitir que fiquei meio bolada com a história naquela época. No final, eu até que gostei, mas durante a leitura eu olhava de uma forma esquisita para os meus pais e fiquei com certo receio de usar roupas com botões — se eu não me engano, cheguei a querer ter um gato.
E foi também a primeira vez que eu me apeguei a uma vilã. Convenhamos, a vilã dessa história é bem malvada. Mas eu achei o máximo ela ter tentado conquistar a Coraline criando um mundo inteiro só para agradá-la e eu acho que cheguei a ficar com um pouco de inveja, porque a Coraline passou a ter duas mães. Porém, isso foi antes de eu chegar ao final da história, ver quem e o que a “segunda mãe” realmente era, ficar completamente apavorada e, muito provavelmente, abrir o berreiro e causar certo pânico na minha mãe.
Na verdade, estou percebendo agora que, já naquela época, eu era bem emotiva com histórias — choro e rio à toa. Talvez, isso dê pano para uma reflexão mais para frente. O que acham? O título pode ser algo bem brega, como: Uma lágrima por página…
Desculpem, estou divagando.
Enfim, foi com Coraline que eu aprendi a gostar de histórias de terror, porque eu vejo hoje que, apesar de ter ficado com medo, percebi que foi um imenso alívio ver que, ao fechar o livro, eu ainda tinha a minha família. Com esse livro, Gaiman me mostrou que eu não devia reclamar do que eu tinha — principalmente no que concerne à minha família e aos meus amigos. Ele mostrou que a realidade pode ser chata, e nem sempre como queremos, mas é o que temos e é a única.
Foi uma lição muito importante — afinal, que criança, jovem ou mesmo adulto nunca ficou insatisfeito ou decepcionado com a sua própria família?
Eu não percebi na época, mas foi com Coraline que eu aprendi… que gatos são animais muito sagazes.
Brincadeira. Aprendi que a fantasia também pode ser assustadora, que a diferença entre um sonho e um pesadelo está no pensamento.
Desde que li Coraline, nunca mais tive medo de livro nenhum — mas não me coloca para ver um filme de terror, que eu me tremo toda.
Hoje em dia — depois de reler essa história maravilhosa e ver o filme, que também é sensacional e eu recomendo muito —, percebo como Gaiman conseguiu pegar um momento da infância da maioria das crianças e transformá-lo em uma trama realmente fantástica — é por isso que eu adoro esse cara! Ele pegou aquela fala que sempre escutamos quando crianças, “menina, não reclama do que você tem! Podia ser bem pior!”, e transformou em uma história.
E eu gosto de pensar que aprendi a lição.
Com apenas 155 páginas e muita criatividade, Gaiman nos dá uma importante lição. Então, agora, quando você se sentir insatisfeito ou decepcionado com alguém e quiser substituí-lo, lembre-se da segunda mãe da Coraline, com seus olhos de botão, e perceba que nem sempre a realidade é tão ruim assim.
E teve mais uma coisa que eu aprendi com Coraline.
Foi que aranhas são criaturas bem assustadoras.