Resenhas

O Barqueiro, de Claire McFall | Resenha

O que acontece quando “tudo acaba”? A morte é, de fato, o fim? Dizem que, quando a morte se aproxima, toda a nossa vida passa num piscar de olhos. Para alguns, isso pode não fazer diferença. Para outros, no entanto, essa reflexão leva a descobertas nunca antes imaginadas. Quase como se pudéssemos nos redescobrir. Em O Barqueiro, de Claire McFall, publicado pela Globo Alt, somos guiados para o mundo inferior, que pode não ser bem aquilo que esperamos.

No livro, acompanhamos a jornada de Dylan, que decide conhecer o pai numa tentativa de se afastar dos seus próprios problemas. Indo contra a vontade da mãe, ela compra as passagens de trem. O que ela não podia imaginar é que sofreria um terrível acidente que a tiraria de seu caminho e a levaria a um lugar totalmente desconhecido. Dylan achava que havia sido a única a sobreviver, mas não poderia estar menos enganada. Ela não sobreviveu. Perdida e desorientada, ela encontra Tristan, responsável por guiar a sua alma até o mundo dos mortos. Juntos, eles enfrentarão muitos desafios e irão descobrir a força do amor.

Qualquer trama relacionada à mitologia grega me interessa. Quando descobri que O Barqueiro é uma releitura do mito de Carontes, o barqueiro de Hades, sabia que teria algo especial nas minhas mãos. E, de fato, eu tive. Apesar do contexto e do cenário, O Barqueiro é leve e extremamente sensível. A narrativa de Claire é envolvente e bem trabalhada, de forma que nos leva a querer acompanhar Dylan e Tristan nessa jornada, por vezes, agoniante. 

Por falar em Dylan e Tristan, que dupla. Dylan é carismática, forte e cheia de personalidade. Muito encantadora. Claire consegue mesclar as tensões da adolescência com as sabedoria e resiliência de alguém que precisou amadurecer e se fortalecer para enfrentar os obstáculos da vida e, agora, encarar a difícil realidade da morta precoce. É impossível não ter empatia por Dylan e suas dores, insegurança e obstinação. 

Por outro lado, Tristan é a racionalidade necessária para equilibrar o turbilhão de emoções resultantes de uma passagem não esperada e geralmente incompreendida. Um papel árduo, solitário e, até mesmo, cruel. A maneira como Claire descreve o trabalho de Tristan em meio aos seus próprios questionamentos é muito bonita e sofrida. E é comovente também perceber que, mesmo ao longo de tantos anos cumprindo a sua função, ele conseguiu desenvolver o mínimo de sensibilidade, de compaixão, para com as almas que carrega. Compaixão essa que ninguém ainda havia demonstrado por ele mesmo (ai, gente, só de lembrar o olho já enche de água).

O Barqueiro, mais do que uma versão “contemporânea” e jovem de uma mitologia, traz reflexões profundas sobre a morte. Não é como se Claire McFall quisesse dar uma lição a todos nós para seguirmos em frente. Ela parece querer compartilhar com seus leitores todas as aflições, medos e incompreensões que permeiam a única certeza que temos na vida. 

Jornalista de coração. Leitora por vocação. Completamente apaixonada pelo universo dos livros, adoraria ser amiga da Jane Austen, desvendar símbolos com Robert Langdon, estudar em Hogwarts (e ser da Grifinória, é claro), ouvir histórias contadas pelo próprio Sidney Sheldon, conhecer Avalon e Camelot e experimentar a magia ao lado de Marion Zimmer Bradley, mas conheceu Mauricio de Sousa e Pedro Bandeira e não poderia ser mais realizada "literariamente". Ainda terá uma biblioteca em casa, tipo aquela de "A Bela e a Fera".

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