Willa, a Garota da Floresta, de Robert Beatty | Resenha
A natureza nos dá exatamente aquilo de que precisamos. Mas o ser humano parece ainda não ter entendido isso. Ganância, vaidade, soberba, egoísmo, autoritarismo. A falta de empatia e de humanidade somada a uma exploração irresponsável dos recursos naturais resulta num desequilíbrio social, capaz de exterminar flora, fauna e sociedades inteiras. E é com muita sensibilidade, porém com extrema seriedade, que Robert Beatty aborda essas questões no incrível Willa, a Garota da Floresta, seu novo livro publicado pelo selo Milk Shakespeare, da Faro Editorial.
Na trama, conhecemos Willa, uma uma garota nascida e criada na floresta, que pertence a um antigo clã. Toda noite, ela tem como missão sair em busca de mantimentos. Para isso, precisa entrar escondida nas tocas das chamadas “pessoas do dia” e pegar o que eles têm em excesso. Uma tarefa arriscada, uma vez que esse povo é capaz de matar tudo aquilo que não conhece, pelo que Willa sempre escutou. Até que, um dia, após um incidente numa dessas missões, algo acontece que muda a vida de Willa e principalmente a sua visão de mundo. A visão que ela mesma tem do seu próprio mundo. Do modo de vida e das atitudes de seu clã. A partir daí, a menina percebe que nem todos aqueles ditos ruins são, de fato, ruins, bem como nem toda a sua comunidade é boa. E essa consciência pode fazer cair tudo aquilo ela achava que sabia ou conhecida.
Desde que li Serafina e a Capa Preta, fiquei absolutamente encantada pela escrita de Beatty. Ouso dizer, como sua leitora, que em Willa, a Garota da Floresta, ele se superou. O que mais me marcou em sua narrativa é o fato de o autor não subestimar o seu público. Sim, os livros de Beatty são considerados infanto-juvenis. Mas a sua obra, para mim, não só pode como deve ser lida por leitores de todas as idades. Willa é tão mágico e profundo que, ao terminar a leitura, me fez refletir por um longo tempo.
A princípio, Beatty poderia cair numa armadilha de apresentar um livro apenas didático. Uma obra voltada para crianças e jovens focada em questões ambientais e sociais. O que também não seria nenhum problema. Inclusive, são assuntos extremamente importantes e necessários e, quanto antes as crianças tiverem conhecimento e especialmente consciência sobre esses temas, melhor para o futuro. Mas Beatty foi além. Ele nos entregou uma verdadeira homenagem à fantasia e à natureza. Com uma escrita leve, mas bastante assertiva e descritiva, o autor nos transporta para o mundo de Willa e nos presenteia com uma história de magia, amizade, lealdade, ancestralidade e, acima de tudo, amor. O amor que vence o ódio, a intolerância e o preconceito.
Willa é uma personagem sensacional. Daquelas que marcam e das quais nunca esquecemos. Ela representa a inocência, a coragem, a determinação, o legado, a tradição, mas também a renovação e a resistência. Uma verdadeira força da natureza. Literalmente. A maneira como Beatty desconstrói tudo aquilo em que a menina acredita, desconstruindo, de certa forma, também a personagem é dura, intensa e quase poética. Quando Willa se vê no meio de dois mundos tão distintos e percebe que pode haver mais semelhanças do que diferenças – tanto para o bem quanto para o mal -, o crescimento e a evolução dela são tocantes. Sua relação com o desconhecido, com tudo aquilo – e todos aqueles – que ela foi ensinada a temer é sutil, leve e inspiradora.
Beatty, Willa, sua avó e outros personagens (eu não quis entrar em detalhes porque acredito que poderia falar mais do que deveria) me tocaram profundamente. Me emocionaram, desesperaram (não tenho mais idade para algumas passagens não, gente) e me ensinaram. Muito. Willa nos faz pensar. Em sustentabilidade, consumo consciente, em família, acolhimento. Willa, a Garota da Floresta é um livro inspirador. Que, de alguma maneira, não foge muito da realidade que estamos vivendo. Por isso mesmo, ele nos traz esperança. Nos fortalece. E eu sempre vou preferir acreditar na magia, no amor e nas Willas que eu sei que estão espalhadas por aí. Somos muitas. E somos mais fortes.