Entrevista: Antonio Cestaro
Em entrevista ao Vai Lendo, Antonio Cestaro falou sobre o seu romance de estreia, ‘Arco de Virar Réu’, que será lançado nesta terça (5), e as diferenças entre o seu trabalho como editor e escritor
As incertezas da mente, a linha tênue entre a sanidade e a doença. Por outro lado, a antropologia nos traz os conflitos entre índios e homens brancos. Essa mistura de temas e debates é o que oferece Antonio Cestaro aos leitores, em seu primeiro romance, Arco de Virar Réu, publicado pela editora Tordesilhas e cujo lançamento acontece nesta terça-feira, dia 5, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo, a partir das 19h. Em entrevista ao Vai Lendo, o autor, que também é editor e dono da editora Alaúde, comentou sobre a sua estreia como escritor de romances, as diferenças entre as suas funções e os desafios do mercado editorial brasileiro.
Na trama de Arco de Virar Réu, acompanhamos a trajetória do narrador-protagonista e os acontecimentos que levam à sua deterioração física e mental, a partir do surgimento dos primeiros sintomas de esquizofrenia em seu próprio irmão. O personagem, que também é um historiador social bastante voltado para o estudo antropológico, acaba por ficar obcecado pelos rituais e pelos costumes dos índios tupinambás. Então, ele começa a se dedicar à ocultação de cadáveres – inspirado justamente por essa outra cultura -, até perceber que a sua própria sanidade mental está prejudicada. Com uma narrativa labiríntica, a ideia do livro era principalmente explorar o resultado desse embate interno constante do ser humano, segundo explicou Cestaro. Ele ressaltou também que o estudo para a obra foi algo natural, que veio de seu próprio ambiente e o ajudou a chegar à conclusão das ideias.
“A inspiração surgiu da vontade de explorar o rico universo da criatividade contido no embate do ser humano com o seu desconforto existencial”, afirmou Cestaro. “A pesquisa para o livro foi cuidadosa, mas não obsessiva. Eu quis trabalhar no texto o meio urbano, que é onde eu vivo, e o ambiente da floresta, dos animais, dos rios… E cheguei à lenda indígena do mãe-da-lua, um pássaro que canta um canto melancólico e profundo. Essa lenda se encaixou perfeitamente nas ideias que eu desejava para o livro. Os índios tupinambás, seus costumes, foram apenas consequências de ter ‘embrenhado na mata'”.
Antes de Arco de Virar Réu, Cestaro já havia publicado dois livros de crônicas, Uma Porta Para Um Quarto Escuro e As Artimanhas do Napoleão. Para o autor, a principal diferença entre os gêneros é o fato de que o romance permite um desenvolvimento mais elaborado da trama, o que, por outro lado, necessita de um cuidado e de atenção maiores por parte do escritor. Cestaro ainda garantiu que seu livro tem como objetivo apenas estimular nos leitores as sensações e reflexões, através das experiências vividas pelo protagonista.
“Não há nenhuma pretensão da minha parte de que o livro venha ajudar quem quer que seja”, indicou. “Ao contrário, o texto foi escrito com a liberdade criativa de quem não deseja o compromisso de orientar coisa alguma. O livro é apenas um convite ao leitor para experimentar o caminho que leva aos becos sem saídas vivenciados protagonista”.
Após trabalhar por vários anos em diversas editoras, Cestaro resolveu abrir o seu próprio negócio, fundando a editora Alaúde – em 2002 – e posteriormente o selo Tordesilhas, em 2011, voltado para a literatura. Ele destacou as principais diferenças entre as suas funções de editor e escritor, porém, que acabam se complementando, no que diz respeito à criatividade e o processo de produção de um livro. Cestaro apontou também para as dificuldades de se firmar no mercado editorial brasileiro, uma vez que, segundo ele, ainda há pouco interesse pela leitura e disse que é preciso ter paciência para ver o resultado. Contudo, ele destacou as expectativas para o selo Tordesilhas, principalmente na ampliação do catálogo para o público jovem, e para o Tordesilhinhas, voltado para o público infantil.
“O trabalho enquanto editor permite a vivência constante no campo das ideias, dos escritos”, explicou. “Arco de Virar Réu e os meus outros trabalhos publicados são resultados dessa condição. A diferença entre a função de editor e escritor é grande e a oportunidade de atuar nas duas pontas enriquece o olhar do editor, que passa a entender melhor a problemática do escritor e sentir, na pele, suas angústias. Por outro lado, permite também experimentar a boa emoção da concretização de um sonho e de seus desdobramentos. Mas os desafios são muitos, a começar pelo baixo índice de leitura que há no Brasil. O amadurecimento do negócio, é também, algo bastante demorado nessa atividade. É como plantar um pé de jabuticaba: você terá que cuidar da planta por anos a fio sem ver a cor da fruta. O selo Tordesilhas, por exemplo, é relativamente novo e ainda não houve a condição de desenvolver um catálogo de boa literatura pensado especialmente para os jovens leitores. Temos lançado bons títulos para esse público, mas ainda não com a regularidade que considero ideal. Pensando na formação de novos leitores, temos o Tordesilhinhas, que reúne obras inteligentes e criativas para o leitor mirim”.