Entrevista: Simone Mota
Conversamos com a autora Simone Mota, que acaba de lançar seu novo livro infantil, ‘Peixe de Abril’, por meio da economia colaborativa, sobre as principais vantagens e diferenças desse formato de publicação
Numa época em que se fala tanto de autopublicação, contar com a ajuda de outros escritores para lançar um livro também se mostra uma boa opção, além de mais rápida e barata. E é justamente sobre economia colaborativa na área literária que a autora Simone Mota irá falar, juntamente com os profissionais que produziram a sua nova obra infantil, Peixe de Abril – lançada no último sábado (21) -, nesta terça-feira, dia 24, a partir das 19h, na Casa da Leitura, em Laranjeiras, zona sul do Rio.
Peixei de Abril, contou a escritora ao Vai Lendo, surgiu de uma aula particular de francês. Apesar de ser voltada para as crianças, a trama de um menino e um pescador que se encontram e iniciam uma conversa sobre um peixe, embarcando numa uma viagem de possíveis histórias para abordar uma brincadeira popular existente no Brasil e na França, promete encantar também os adultos. Para Simone, a troca de experiência com os outros escritores permitiu uma liberdade criativa maior para o desenvolvimento da obra.
“Foi uma experiência muito rica de conhecimento de e troca principalmente (a economia colaborativa)”, explicou ela. “Pudemos vivenciar e aprender um pouco da dinâmica da prática de trabalho de cada um, com um olhar mais tranquilo e respeitoso. Mas, acima de tudo, foram momentos de muita amizade, porque envolveu transparência e verdade. A diferença principal nesse tipo de publicação é a liberdade e o compromisso. Liberdade de uma criação coletiva e o compromisso com cada um dos envolvidos. Nós escolhemos trabalhar juntos e topamos esse desafio de fazer o nosso melhor. No modelo tradicional, você tem seu texto acolhido por uma editora e, dali em diante, a editora vai orquestrando o trabalho para chegar ao objeto livro com uma adequação ao catálogo da editora. A autonomia do autor é diferente. E o trabalho também”.
Simone exaltou o papel da internet, no que diz respeito às facilidades da autopublicação, contudo, ressaltou também que, no caso dos livros infantojuvenis, a realidade ainda não se mostra tão acessível, devido a “particularidades no fazer e no custo”. Por isso, uma proposta colaborativa se mostra mais eficiente, principalmente porque estimula o escritor a se inteirar melhor do próprio mercado editorial.
“Para a publicação de livros para infância, a autopublicação não é uma realidade que abre portas tanto quanto para a literatura de ficção jovem/adulta”, declarou. “Os livros de literatura infantojuvenil têm particularidades no fazer e no custo, de impressão principalmente, que demandam um investimento alto e, às vezes, inviável para uma baixa tiragem e impressão por demanda, que é a grande sacada da autopublicação. Plataformas digitais, por exemplo, funcionam muito bem para publicar livros para um público que escolhe e paga pelo que consome, que não é o caso de crianças. O objeto livro, com toda a sua arquitetura, é fundamental para esse público infantil. Acredito que buscar colaboradores no seu networking e um investidor, seja via crowndfunding, parceria ou financiamento com prazo, pode ser mais interessante para essa proposta colaborativa, quando se trata de livros de literatura infantojuvenil. Há, inclusive, algumas editoras de pequeno porte apostando em parcerias dessa natureza. Mas, antes de qualquer ação, é preciso pensar no seu objetivo, no seu desejo. Esse jeito de fazer, de forma colaborativa, como qualquer outra forma, não vai operar milagres. Pelo contrário, exigirá do autor (principalmente) um esforço muito intenso. E, talvez, seja esse o ponto que mais ajude o autor. Porque vai demandar dele estudar e conhecer o mercado editorial”.
Com obras que fazem intercâmbios em outras línguas – seu livro A Turma da Princesinha foi traduzido para o inglês -, Simone também é uma das autoras confirmadas no Canalzinho, evento que leva a literatura infantil e infantojuvenil brasileira a outros países, no caso, França e Inglaterra. De acordo com ela, é fundamental ampliar o acesso à literatura nas mais variadas partes do mundo para que se aumenta ainda a nossa própria visão de mundo. Em relação às crianças, especialmente, Simone, que também escreveu a série Eu Não Gosto De – com temas específicos do dia a dia dos pequenos leitores – apontou que essa abertura é importante para que elas ganhem cada vez mais espaço para se manifestar.
“A literatura para mim não tem fronteiras, nem de espaço nem de tempo”, disse. “Quanto mais acesso temos à literatura, seja de que parte do planeta for, ampliamos nossa visão de mundo. A língua não pode ser uma barreira. Mas, já que são tantas pelo mundo, devemos fazer delas pontes para alcançar os leitores, onde quer que eles estejam. Quando fiz a A Turma da Princesinha em inglês, foi com o objetivo de levar o conhecimento sobre a cidade de Macaé a uma população estrangeira residente na cidade; já o Peixe de abril chegou pelo francês naturalmente e, quando começamos com o Coletivo Solo, lembrei-me logo da Elise Carpentier, uma ilustradora francesa que conheci em Macaé e trabalha com xilogravura, que é uma técnica de identidade direta nossa com o cordel. Convidei Elise para o Coletivo e ela topou; a partir disso que começamos a pensar em outras possibilidades, como a produção de um e-book em francês. Também devo confessar que há um pouco do meu inconsciente nisso porque sou apaixonada por Línguas, LIBRAS, inclusive. Só precisamos prestar atenção para não escorregar no didático. Os temas que abordo são importantes e estão presentes na literatura, na vida. Mas um livro da coleção Eu não Gosto De, como o Dividir Meus Brinquedos, por exemplo, pode trazer para um leitor questões que não tenham absolutamente nenhuma ligação direta com o assunto do livro. É a experiência do leitor que vai fazer o livro. O imaginário, o irreal, é sempre um excelente caminho para alcançar as crianças. Observá-las e buscar a nossa melhor forma de comunicar com elas e com a nossa própria infância também. Surpresa, espanto, humor, provocação e um certo incômodo é o que nos aproxima da literatura. Um adulto pode ler um livro e achar uma bobagem, e esse mesmo livro pode provocar um contentamento na criança. Ampliar nosso olhar, observar mais a criança, não tirar dela o que a interessa, mas oferecer sempre mais possibilidades acredito que seja um caminho”.
Simone adiantou que seu novo livro deve trabalhar a questão da identidade com as crianças e também garantiu que Peixe de Abril foi apenas o primeiro título de um projeto colaborativo, mas o objetivo atual é promover a publicação, que já tem uma série de outros lançamentos marcados.
“A história desse novo livro em que trabalho está me transformando, porque estou aprendendo muito com esse texto”, afirmou. “Quanto ao Peixe de Abril, ele é o primeiro livro de um projeto desse nosso fazer coletivo, que está apenas começando. O Coletivo Solo tem mais profissionais envolvidos, outros autores, uma estudante de Letras, uma professora de Língua portuguesa e uma tradutora, e é certo que virão outras publicações. Não sei se necessariamente seguindo a mesma trajetória do Peixe de Abril. Provavelmente, algo similar, porque uma das autoras do grupo tem uma relação estabelecida com os Estados Unidos. Outras ideias estão surgindo de fora também, alguns profissionais do mercado já estão querendo fazer parte do grupo, enfim… Daremos um passo de cada vez e tudo com muito planejamento, sem pressa, e procurando sempre fazer o melhor. Nesse momento, nosso esforço é pelo Peixe de Abril que vai fazer uma série de lançamentos: Zona Norte, Zona Sul e Centro do Rio de Janeiro, Niterói, Macaé e Resende, durante o mês de junho. Temos um divulgador trabalhando o livro em escolas também e, para julho, já temos algumas datas marcadas. Depois, em agosto, eu estarei no Jequitibá de Poesia participando do Casa Brasil, durante as Olimpíadas. E, em setembro, no Canalzinho, em Paris e Londres”.