Vencedoras do Concurso FNLIJ falam sobre o incentivo à leitura
Sol Mendonça e Antonella Catinari, vencedoras do Concurso FNLIJ Leia Comigo!, destacaram também o caráter de resistência do evento e apontaram as dificuldades de se formar novos leitores no Brasil
Um espaço exclusivo voltado para uma atividade muito especial: a leitura. O incentivo à leitura é o foco do Salão FNLIJ do Livro para Crianças e Jovens, cuja 18ª edição foi realizada dos dias 8 a 19 de junho, no Rio de Janeiro. Além das atividades, que incluem encontro com escritores e ilustradores e bibliotecas para os pequenos leitores, além dos estandes das editoras, o evento conta ainda com prêmios para aqueles que desejam relatar experiências voltadas para a formação de novos leitores. Este ano, as escritoras Sol Mendonça (E Com Quantos Paus se Faz Uma Canoa?, editora Gryphus) e Antonella Catinari (A Bicicleta e o Tempo, editora Record) foram algumas das premiadas no Concurso FNLIJ Leia Comigo!. Em conversa com o Vai Lendo, elas falaram sobre a importância do incentivo à leitura e as dificuldades de se formar novos leitores no Brasil.
Sol, vencedora na categoria de relato real com o conto Menino Maluquinho encontra a Menina dos Fósforos, disse que a sua narrativa foi inspirada nos sobrinhos e defendeu que a iniciação à literatura deve ser feita em casa, a partir do exemplo dos pais.
“O meu relato foi um relato familiar”, declarou. “Eu acho que o incentivo à leitura começa com as famílias leitoras. De geração para geração”.
Para Antonella, que recebeu o prêmio na categoria relato ficcional pela obra Vovó Viu o Livro, o concurso é fundamental sobretudo para fomentar a escrita e a imaginação, estimulando o desenvolvimento dos próprios autores.
“Essa é a base da literatura (a escrita)”, afirmou. “Se você não tiver o texto, o que ler, não vai ter projeto nenhum. A nossa contribuição, enquanto profissionais, é a do escritor. Ter o estímulo de fazer um texto de qualidade. É aí que eu acho que está o diferencial da premiação. É fomentar a criação do escritor de qualidade”.
Antonella, que também é professora, ressaltou, contudo, que o Brasil passa por um momento de transição, no que diz respeito à literatura. Para ela, agora é a hora de se encontrar uma saída e manter não apenas as iniciativas de incentivo à leitura, a longo prazo, mas também e principalmente mudar a maneira de se trabalhar o livro, pensando de forma mais comercial para que haja um crescimento no mercado.
“Esses eventos são muito importantes, eu vou continuar apoiando esse salão como o ‘salão da resistência’, como temos chamado”, disse. “Vou continuar apostando em literatura e formação de leitores. Eu sinto que, hoje, as editoras estão sendo desafiadas no Brasil a formar um público leitor. Ao longo dos anos, eu vi um grande avanço no país. Eu acompanhei, comecei a dar aula na época dos projetos de ciranda de leitura, isso há mais de 30 anos. Mas o problema do Brasil é que nada é de longa duração. A cada troca de governo, os problemas são substituídos. Os projetos não são mantidos. Por isso, as editoras têm um papel fundamental, que, para mim, não está sendo cumprido. Elas se acomodaram achando que o governo é o grande comprador de livros e, portanto, não precisam investir na formação do desejo do leitor. Por que uma mãe, quando o bebê nasce, sai comprando vários produtos que ele ainda não pode usar, mas não se preocupa, então, em comprar um livro também, por exemplo? Por que as editoras não tornam o livro um objeto industrial, comercial, como esses produtos? A editora é uma indústria, ela vive de lucros dentro do sistema capitalista. Então, está na hora de tratar esse objeto, o livro, como os outros objetos. Quando isso é feito, vende. Harry Potter foi tratado dessa maneira. As crianças queriam aquele livro, desejavam aquele livro. Mas não temos isso. Ninguém tem mais esse desejo. Está na hora dessa virada. Olhar para o livro como arte, mas também como objeto de desejo. Ele pode ser de entretenimento e de qualidade, mas tem que vender o produto”.
Sol fez coro à colega e reiterou que, se não houver esse comprometimento, se esse estímulo ao desejo de ter um livro não for trabalhado, fica muito difícil manter qualquer tipo de iniciativa nesse sentido.
“A gente vê um evento como esse, que tem uma biblioteca para criança, para bebê, espaço para os jovens… Por que não fica tão cheio quanto os outros eventos literários?”, questionou. “No salão, a literatura é prioridade, é a atração única e principal e não compete com nenhuma outra, como a Bienal, por exemplo. Então, por que os pais preferem levar os filhos ao shopping do que trazer para o Salão, onde as crianças podem brincar com os livros? O livro pode ser um brinquedo e também virar objeto de desejo das crianças. Mas aí já entra a questão que várias gerações também não são leitoras. Então, como você pode ensinar o seu filho a amar um livro, a ter interesse pela leitura, se você não dá o exemplo? Essa é outra batalha. É fundamental que as pessoas continuem batalhando para eventos como esse. Ainda tem muita gente resistindo e fazendo livro porque acredita na literatura. O livro é mais do que apenas educação”.