Origem, de Dan Brownn | Resenha
‘Origem’: uma reflexão promovida por Dan Brown
Fé x ciência. A crença em contraponto às ciências exatas. Um eterno “duelo de titãs”. Uma guerra que, há séculos, tenta converter seguidores para ambos os lados. E desacreditar todas as convicções. Com o avanço da tecnologia, a religião se viu obrigada a lidar com cada vez mais questionamentos e as mudanças de paradigmas. Mas até onde vai esse conflito? Será que até o momento em que a ciência conseguir responder às perguntas fundamentais da humanidade? E, mais ainda, será que a ciência conseguirá efetivamente desacreditar Deus, um dia? Esse é o plot de Origem, o novo livro de Dan Brown, publicado pela editora Arqueiro.
Na obra, acompanhamos uma nova trama envolvendo o professor de simbologia de Harvard Robert Langdon. Desta vez, Langdon é convidado para assistir a uma apresentação extremamente restrita idealizada pelo futurólogo bilionário Edmond Kirsch, seu ex-aluno, no Museu Guggenheim de Bilbao. O que Kirsch promete mostrar na ocasião é algo que pode “mudar para sempre o papel da ciência” e responder às duas questões fundamentais da existência humana: de onde viemos? Para onde vamos? Quando Langdon percebe que o evento irá causar inúmeros debates e polêmicas, a noite que Kirsch havia planejado meticulosamente para ser algo inesquecível se transforma num verdadeiro pesadelo, ameaçando a incrível descoberta de ser perdida para sempre. Mais uma vez, Langdon precisa correr contra o tempo e terá a ajuda de Ambra Vidal, a diretora do museu que ajudou Edmond no planejamento da apresentação. Juntos, eles precisam encontrar uma senha para ajudar a revelar o segredo do amigo, em meio a uma conspiração que envolve fatos históricos, extremismo religioso e o possível envolvimento do Palácio Real da Espanha.
Origem é o sétimo e aguardado novo livro de Dan Brown, sendo o quinto protagonizado pelo personagem do professor Langdon. Utilizando-se de sua bem-sucedida fórmula narrativa, Brown recorre ao mesmo formato e ferramentas de escrita que o tornaram um fenômeno mundial. Não que isso seja ruim. É normal que alguns autores utilizem padrões semelhantes em suas obras que já funcionaram com o público. Pessoalmente, eu ainda consigo ver isso como um “estilo narrativo”. Quase uma assinatura. Com Dan Brown, assim como outros escritores, você meio que já espera pelo que vem, já sabe, mais ou menos, como o autor vai guiar o leitor ao longo da leitura. Sinceramente, não me importo nem um pouco com isso. Afinal, gosto do autor justamente pelo seu estilo de escrita. Mas também gosto de ser surpreendida e, ainda que Origem, diferentemente de alguns de seus best-sellers, como o Código Da Vinci, Anjos e Demônios e Ponto de Impacto (ainda não li Inferno. Eu sei, gente, que vergonha. Mas já está na lista deste ano, não se preocupem), demore um pouco a engrenar de vez e ceda àquele subterfúgio de guardar a informação e nos segurar até o último ponto de cada página propositadamente, gostei bastante do resultado final do livro.
Dan Brown me causa uma sensação muito esquisita com seus livros. Ao mesmo tempo que eu sinto uma curiosidade alucinante, quase uma angústia por respostas, gosto daquela ansiedade, da expectativa em torno do que mais ele vai me apresentar. É quase como se estivéssemos desafiando um ao outro. Tipo “eu escrevo, você tenta absorver, refletir e questionar”. É muita informação e tramas interligadas que envolvem o leitor de uma maneira bastante dinâmica. Origem, claro, não foge à regra. E eu realmente gostei desse livro. Gostei, principalmente de ter sentido, no final, uma mudança de perspectiva que eu não esperava.
Como em todos os seus livros, com Origem Brown questiona, cutuca e impõe reflexões massivas a respeito da religião e do extremismo, de um modo geral. Mais uma vez, temos personagens fortes, misteriosos e ambíguos representando a fé e a ciência em todos os níveis, para todos os credos e percepções. É muito interessante como o autor nos leva por todos os caminhos e tenta nos mostrar as fragilidades, fraquezas e possibilidades dessas realidades. Gosto de sua tenacidade ao escrever e de como deliberadamente ele joga as informações para cima do leitor – contudo, de maneira bastante organizada e profundamente perspicaz – para que nós mesmos criemos as nossas próprias consciências e cheguemos às nossas próprias conclusões.
Langdon, por sua vez, sempre foi um personagem carismático. Sua inteligência e uma quase ingênua simplicidade são extremamente cativantes. Eu acho incrível acompanhar o seu raciocínio ao longo dos inúmeros desafios e enigmas. Robert Langdon, de certa forma, também me faz raciocinar para seguir o seu ritmo. Sinto-me estimulada, de verdade. Em Origem, sua companhia é Ambra Vidal, mais uma personagem feminina forte e cheia de personalidade, cuja química com Langdon, para mim, foi uma das melhores. E não posso, de forma alguma, falar de Origem sem citar Winston, minha maior surpresa neste livro. Infelizmente, não posso me estender muito sobre ele porque seria um spoiler daqueles de espírito de porco literário, mas o que eu posso dizer é que compartilho dos mesmos sentimentos, conflitos e emoções de Langdon – em todos os momentos – relacionados a Winston. Sagaz, Brown, muito sagaz.
Na verdade, Origem é justamente isso: um misto de emoções e de reflexões. Achei muito interessante a maneira como Brown explora a religião, a ciência, o extremismo e a ética e, ao mesmo tempo, foge de uma narrativa didática. Não foi uma agressão aleatória ou despropositada a uma doutrina, crença ou ideais. Não foi uma tentativa de converter alguém ou de criar uma seita para seguirmos aquilo que Brown escreve. Foi um convite para questionarmos a nós mesmos como indivíduos e como sociedade. Refletir como nos comportamos, nos identificamos e o que esperamos. Gostei das reviravoltas, especialmente a do final, que me causou um incômodo profundo e uma auto-reflexão de algumas boas horas. É difícil me aprofundar numa análise sobre um livro cuja temática por si só já é um spoiler, que dirá o seu conteúdo. Mas o que eu posso dizer é que, mesmo depois de tanto tempo, Dan Brown e Robert Langdon ainda conseguem captar toda a minha atenção.