A Música do Silêncio, de Patrick Rothfuss | Resenha
‘A Música do Silêncio’: uma história delicada, mas que não vai agradar a todos
A A Música do Silêncio é um livro que mudou, se não completamente, muito significativamente a minha forma de pensar e de ver as coisas. Mas é uma obra difícil e para poucos por causa não apenas da sua linguagem, mas pelo conteúdo em si. Essa pequena história do universo de As Crônicas do Matador do Rei, de Patrick Rothfuss, publicado pela editora Arqueiro, pode ser caracterizada como um livro bem peculiar.
Eu sou uma grande fã dessa série e desse autor, então, quando fiquei sabendo que uma história à parte da trama original seria lançada, fiquei muito animada. Mas, sinceramente, não esperava um livro como esse. Acho que ninguém esperava, na verdade.
A história de A Música do Silêncio gira em torno de uma das personagens mais enigmáticas da saga, a Auri. E isso foi mais um fator que me deixou completamente eufórica ao saber da existência desse livro, porque a Auri, desde a sua primeira aparição, me deixou curiosa. Contudo, o engraçado é que a trama gira em torno dela, de tudo o que faz e de como ela pensa, mas não esclarece nada sobre quem ela é ou foi e nem como ela foi parar ali.
O livro recorta uma semana da vida de Auri, durante a qual ela vive os seus dias normalmente, no subterrâneo da cidade, com os seus afazeres e sua rotina. Um diferencial é a sua ansiedade quanto à chegada de um visitante e amigo, que quem tiver lido As Crônicas do Matador do Rei vai saber quem é, e a pressão de encontrar um presente ideal para ele. É um costume deles levar algo para o outro sempre que se encontram.
À primeira vista, esse resumo não apresenta nada de diferente. E, realmente, não há. O diferencial está na Auri, em suas ações e, acima de tudo, no seu modo de pensar, que é o mais fascinante, no fim das contas. A Auri é uma garota indecifrável, que vê o mundo de um jeito bem peculiar. E é justamente essa visão que o autor tenta nos mostrar.
Foi um livro que me deixou arrepiada e me fez ficar uns dez minutos olhando para o nada e questionando todas as minhas certezas e a minha forma de ver o mundo. Mas eu achei de difícil interpretação. Levei dias pensando nisso e demorei para conseguir concluir alguma coisa. E, pessoalmente, eu gosto muito disso em um livro e a conclusão a que cheguei me agradou bastante. Descobri uma visão muito delicada, mas, ao mesmo tempo, muito real. Não vou falar aqui o que foi, porque quem garante que o que eu concluí será o mesmo que você, certo? Para entender o que estou falando, só lendo o livro.
E eu recomendo isso fervorosamente. A maioria pode não gostar e até querer desistir antes de chegar na metade. Mas vale a pena tentar.
Não, não tem ação. Não tem pancadaria. Não tem sangue espirrando, nem gente morrendo e gritando. Sim, o autor passa dez páginas descrevendo a fabricação manual de um sabonete. E, pelo que vi, foi aí que as pessoas que não gostou do livro enlouqueceu.
E apesar de não ter pancadaria, batalhas épicas, feitiços ou qualquer coisa do gênero, poucos foram os personagens que já vi que são tão ativos quanto a Auri.
E, só para constar, achei essas dez páginas sobre o sabonete bem mais legais do que algumas cenas de batalha que já li. Porque Rothfuss conseguiu tornar isso belo e até poético para alguns leitores.
E, no final, eu ainda aprendi a fazer sabonete! Acha pouco?
Ok. Brincadeiras à parte, o livro é lindo mesmo.
E eu gostaria de atentar para o título também. Em português, o título ficou como A Música do Silêncio, que não é lá tão fiel ao título original, mas ainda é verdadeiro no contexto da história, porque a Auri nos mostra que há música no silêncio.
Tudo o que se pode ouvir é música. Nós ouvimos o silêncio, então, há música nele.
É um belo título. Eu gostei.
E o título original, The Silent Things — As Coisas Silenciosas, sob minha própria tradução — também me agrada. É a essência do livro e da Auri. Porque ela consegue ouvir essas coisas silenciosas e mostrar que o mundo não gira ao acaso e nem ao nosso redor.
Quanto ao trabalho da editora, está excelente, como esperado. A capa está linda demais — dentre todas as versões que vi, foi a que achei mais bonita. O livro está com boa diagramação, ótima revisão e, acima de tudo, excelente escolha de obra para publicação. Sinceramente, mando o meu muito obrigado para a editora Arqueiro por ter trazido para o Brasil essa obra.
A Música do Silêncio está entre os melhores livros que eu já li. Pretendo ler de novo, com certeza, porque não é possível que eu tenha conseguido pegar tudo o que esse livro tem a oferecer. E, se antes eu era fã do autor, agora sou perfeitamente capaz de montar um time de torcida só para ele.
Leiam esse livro. Ou, pelo menos, tentem.
Um comentário
Ingrid
Compartilho de tudo o que tu escreveu, e se tem uma parte favorita pra mim, essa parte é a do sabonete! Hahahahahhaahhaah. Tu descreveu com perfeição o quanto esse livro impressiona. Cheguei aqui atrás de opiniões sobre os enigmas por trás dessa história, mas como tu disse, cada um interpreta de um jeito diferente. De qualquer forma eu gostaria muito de ler sobre o que tu entendeu do livro. Se um dia quiseres escrever por favor me manda! Meu e-mail é [email protected] abraço, Ingrid