Entrevistas

Por dentro da Trama

Conversamos com André Marinho, editor do selo do Grupo Ediouro que completa um ano, sobre mercado de nicho, identidade visual e, claro, Brandon Sanderson!

Dois gêneros clássicos, com leitores fiéis (e bastante exigentes) em todo o mundo, finalmente têm uma editora disposta a dar a eles o espaço e a importância que merecem. Comemorando um ano de existência, a Trama – selo do grupo Ediouro – surgiu para suprir uma grande demanda com foco nos seguintes mercados de nicho: thriller e fantasia.

A Trama, contudo, vai além, esmiuçando as nuances de seu catálogo ao identificar os títulos a partir dos subgêneros aos quais pertencem: crime thriller, psychological thriller, historical thriller, action thriller, epic fantasy, urban fantasy, magic realism e paranormal fantasy. Um trabalho mais especializado e direcionado, como explicou André Marinho, editor da Trama, em entrevista exclusiva ao Vai Lendo.

“Não acho que trabalhar com nichos seja necessariamente mais fácil, porque o próprio fato de definir um público exige a presença de um trabalho especializado. Acredito que, considerando as infinitas possibilidades editoriais, um recorte assegura aos leitores esse trabalho mais qualificado, mais direcionado e de rápida identificação”.

André Marinho, editor da Trama / Divulgação

Para André, o principal objetivo neste conceito de nicho é melhorar a experiência dos leitores, facilitando a busca por títulos com os quais se identifiquem. Consequentemente, isso cria uma comunidade literária fidelizada.

“O fato de a maioria dos grupos editoriais abarcarem selos dirigidos a diferentes públicos, a meu ver, confirma essa ideia, mas acho que, muito menos do que a importância para o mercado ou certa facilidade na construção de um catálogo, isso tem mais a ver com assistir aos leitores, que, em meio a uma profusão de ofertas e informações pulverizadas, próprias do nosso tempo, passam a ter a possibilidade de encontrar facilmente determinado tipo de leitura que mais lhes agrade e, quem sabe, se identificar com ele”, explicou. “Isso é bom para ambos os lados: leitores, que têm em mãos o resultado de um trabalho pensado para sua melhor experiência, e editoras, que vão estudar cada vez mais o perfil dos leitores para atendê-los melhor e oferecer a eles títulos que certamente vão render um ótimo entretenimento”.

Com uma curadoria feita pelo próprio André, em parceria com Trini Vergara e sua equipe – responsável por comandar uma editora também especializada em thriller e fantasia para o mercado de língua espanhola -, a Trama inclui em seu catálogo nomes como John Vercher, Janelle Brown, Jen Williams, Cara Hunter, Gareth Hanrahan, Constance Sayers, entre outros. E como lidar com os leitores dos gêneros, sempre tão interessados, participativos e principalmente ansiosos?

“Sem dúvida há uma pressão maior, mas essa pressão também é uma espécie de termômetro, que diz o quanto os leitores estão satisfeitos com nosso trabalho, com o que estamos entregando, com a experiência de leitura que estamos oferecendo. Pelo menos, eu interpreto desta forma”, declarou. “Estamos comemorando o primeiro aniversário da Trama e ainda fico surpreso com o tanto que colhemos ao longo desse ano de aventuras: mais de vinte mil seguidores, autores felizes por estar em contato com leitores brasileiros, livros sendo reimpressos, lançamento de um clube de assinaturas, aquisição de títulos sensacionais, fora a receptividade e a simpatia dos leitores, que é o que me deixa mais feliz. Todos são muito ativos nas nossas mídias sociais, muitos fazem resenhas por conta própria, comentam, dizem o que buscam, o que podemos melhorar, enfim, a gente procura levar em consideração tudo isso, e, assim, nossa comunidade está se formando com passos muito firmes. A expectativa era retomar este lugar no mercado, e acredito fortemente que a Trama vem avançando neste caminho”.

Para conseguir atingir este objetivo, contudo, é preciso vencer alguns desafios. Especialmente quando se lida apenas com dois gêneros literários e suas especificidades de mercado e de público. Em relação aos thrillers, como trabalhar algo já consolidado e popular?

“Creio que a Trama tenha surgido com uma proposta mais ousada, concentrando em um mesmo selo e de forma especializada um gênero que se divide entre muitos lançamentos, todos os meses nas livrarias”, ressaltou. “Por isso, desde a concepção do projeto, sempre foi muito importante para nós que os leitores se identificassem com a nossa imagem, com a nossa linguagem, para que o desafio inicial pudesse se converter em uma oportunidade de sucesso”.

Já em relação à fantasia, André destacou as dificuldades tanto em termos rentáveis quanto no quesito de suprir a alta demanda de um público que, após tantas desilusões relacionadas à interrupção de lançamentos, sente dificuldade – com razão – de confiar no trabalho das editoras que se dispõem a trabalhar este gênero.

“Acho que o desafio (com a fantasia) é ainda maior, pois, além de termos livros bastante trabalhosos e que requerem um cuidado especial na produção, temos também toda uma comunidade de fãs ávidos, muito exigentes, fiéis e participativos, a quem queremos entregar o nosso melhor”, garantiu. “Muitas editoras brasileiras têm sido bastante reticentes quanto a apostar neste gênero e, sem dúvida, há razões muito compreensíveis para isso, sobretudo o fato de, por vezes, os custos se sobreporem ao retorno em vendas. Isso acabou deixando muitos fãs de fantasia órfãos por aqui, com a interrupção de projetos ou desistências de publicações já anunciadas. Penso que o maior desafio da Trama é dar fim a este sentimento de ‘falta de confiança’, mostrando com muita humildade nosso compromisso com os leitores e que eles fazem parte do projeto tanto quanto nós”.

Trama Box

Seguindo as tendências do mercado editorial, a Trama também entrou na onda dos clubes de assinatura. O Trama Box oferece mensalmente aos assinantes um thriller inédito exclusivo, além de um kit que amplia a experiência literária.

Reprodução site Trama Box

“Uma vez que a identidade da marca já estava mais estabelecida, o caminho para o clube de assinaturas foi bastante natural”, disse André. “Mesmo com a presença consolidada de outros clubes literários que dialogam com o nosso, sabíamos que a Trama tinha todos os requisitos para elaborar um projeto de qualidade. Então por que não? À semelhança do selo como um todo, que se caracteriza por focar em determinados gêneros, o Trama Box surgiu também com este diferencial, e nosso maior trunfo, creio eu, é a parceria com a Coquetel, pois podemos oferecer um entretenimento, além das histórias, com jogos e passatempos que contemplam a trama dos livros e enriquecem a experiência do assinante todos os meses”.

Identidade Visual

Por falar em marca, a identidade visual e o trabalho gráfico da Trama chamam bastante atenção. Formas simples, cores chamativas e cada gênero literário contemplado com a sua própria logo e conceito. Tudo pensado para refletir tanto a unidade da marca quanto as particularidades de cada subgênero.

“Nós tivemos a felicidade de os designers talentosíssimos Angelo Bottino e Fernanda Mello aceitarem o desafio de criar uma marca que transmitisse uma unidade explícita nas capas, porém sem perder a versatilidade e a singularidade de cada título”, afirmou. “Partindo desse briefing, a solução foi criar uma série de selos que, de longe, parecem o mesmo (o que reforça a identidade da marca), mas que de perto revelam um grafismo único, representando cada subgênero. A inspiração na op-art, além de ressaltar uma pegada pop moderna que agrada jovens e adultos, transmite uma sensação de mistério, de que nada é o que parece, de ilusão e perspectiva, e isso tem tudo a ver com os gêneros trabalhados pela Trama”.

E o Brandon Sanderson?

Esta, talvez, seja a pergunta mais feita atualmente nas redes sociais! Isso porque a Trama anunciou ninguém menos do que o autor Brandon Sanderson em seu catálogo, com a aguardada série The Stormlight Archives, depois de um longo processo de negociação. E haja bom humor e criatividade para responder aos fãs ansiosos.

Brandon Sanderson / Divulgação

“Lá vem mais uma perguntando isso (risos). Brincadeiras à parte, toda a equipe da Trama está muito feliz com a chegada do Brandon Sanderson à nossa casa. Assim que soubemos que os direitos da série The Stormlight Archives estavam disponíveis para o Brasil, imediatamente começamos a nos movimentar para adquiri-los. O processo foi bastante longo e trabalhoso, muito estudo e negociação, mas valeu cada segundo. Ter um grande autor do porte do Brandon Sanderson e uma das séries mais aguardadas de todos os tempos em nosso catálogo, sem dúvida nenhuma, consolida a Trama como uma peça importante na veiculação da literatura fantástica em nosso país, o que nos deixa muito orgulhosos”.

A Trama, garantiu André, tem consciência da responsabilidade de trazer a obra de Sanderson para o Brasil. Ele afirmou ainda que a editora não está medindo esforços para superar as expectativas dos leitores. Para os mais ansiosos, contudo, o editor já disse que nem adianta apressar. Segundo ele, o livro só sairá quando estiver “perfeito”. Nós tentamos, Brasil!

“É claro que gera mais pressão (a expectativa dos fãs), risos. Não apenas neste caso, mas na Trama, de modo geral, os leitores participam e influenciam nos nossos processos. Estamos muito felizes em saber que tanta gente está interessada nos livros e confiando na Trama para trazer algo por que esperam há muitos anos. O frio na barriga é tanto dos fãs quanto nosso por carregar tamanha responsabilidade nas mãos. O que posso garantir é que estamos fazendo o melhor trabalho possível, minuciosamente, com todo o cuidado do mundo, para que os leitores tenham orgulho de ter ‘o tal calhamaço’, como eles dizem, nas estantes. Então, não adianta apressar, porque só vai sair quando estiver tudo perfeitinho!”.

Jornalista de coração. Leitora por vocação. Completamente apaixonada pelo universo dos livros, adoraria ser amiga da Jane Austen, desvendar símbolos com Robert Langdon, estudar em Hogwarts (e ser da Grifinória, é claro), ouvir histórias contadas pelo próprio Sidney Sheldon, conhecer Avalon e Camelot e experimentar a magia ao lado de Marion Zimmer Bradley, mas conheceu Mauricio de Sousa e Pedro Bandeira e não poderia ser mais realizada "literariamente". Ainda terá uma biblioteca em casa, tipo aquela de "A Bela e a Fera".

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